quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Mais ou menos um dia

Olho pela janela
e revejo-me nela,
despedaçada
confusa
misturada na paisagem...

Toda eu sou feita de chuva...

E é como se, de repente,
a minha alma tivesse
transformado e abraçado
tudo o que me rodeia!

Lá fora como cá dentro
todas as ruas são labirintos
feitas de um cinzento escuro
que não deixa passar luz
para derreter o que sinto!

Lá fora como cá dentro
ficou esta espera
cega
pelo arco-íris
que teima em não aparecer...
A chuva escureceu o dia
e o dia não deixa, sequer, prever
o brilho tímido da lua!

Ela está em tudo o que é meu
pois toda eu sou feita de chuva...

CFV

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Colher tempestades

As lágrimas confundem-se com a chuva
e o olhar perde-se entre pingas
que, de gota a gota,
transborda em sentimentos
turvos
ao rubro
e confusos...
É assim, como uma ventania, que destrói
uma tempestade que sempre dói!

O silêncio ficou
como um trovão inesperado
depois de palavras
assustadas
atiradas
como facas
quando deviam ser abraços,
depois de palavras
de dor
espetadas
quando deviam, só,
espicaçar o amor...

O medo mistura-se
com o desejo vivo
quando, o certo,
era já ter morrido...
mas continua aqui,
constante,
a sussurrar-me ao ouvido,
a lembrar-te,
doce sabor
que, agora, amarga
e mais sabe a castigo!

No meio desta escuridão
sente-se o cheiro inebriante
de um medo há muito temido
traz com ele um prenúncio
que não encaixa ainda
que, desesperadamente,
se recusa, porque não tem sentido...
Empurra-se, num último reduto de esperança,
esse fim à vista
para longe do coração...

Não confundas mais esta alma
que de intensa
ficou suspensa
nesta luta agonizante
de quem não queria
mas que já perdeu a calma!

O sorriso
afinal, voltou a ser breve
ficou aí, novamente, contigo
longínquo
e agora, em parte incerta...

Virámos tempestade
talvez porque não suporte a tua verdade
nem tu, alguma vez, tenhas querido a minha...
Odeio a despedida
e mais quando é injusta e nem, assim,
deixa de ser sentida!
O Adeus traz-me a morte lenta
o definhar até me fazer sentir pequenina...

CFV



Rei do cinismo

Sorrir a morder a língua
ouvido que se faz surdo
alma distante mas ligada
ao pensamento mordaz...
que tem vivido encarcerado!

O cinismo impera
rei e senhor
neste sítio minado
por gente convencida
que tem o palco e os holofotes
como vida!

Dói-me a cabeça
de tanto cansaço
olham por mim, olhos baços
quando tudo o que querem
é fechar-se de tão saturados...

Não pertenço aqui
soube-o desde o primeiro instante
e, no entanto, aqui estou
com medo de perder tudo o que sou!

A liberdade pode viver encarcerada?
O sorriso aberto pode ser transformado?
A alma intensa pode acabar em nada?

Nestes corredores
que percorro cabisbaixa
tento sobreviver
invisível...
porque aqui,
ele é rei e senhor,
impera o cinismo
sem qualquer pudor!

CFV

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Mortalha


Até a inspiração se perdeu
no meio deste nada
que impuseram como meu...

Fiquei nesta noite
fria e interminável
que me suga
lentamente
esvai-se, gota a gota,
a energia
e mantém- se, instante a instante,
esta letargia,
presa... imóvel...
à espera que passe
à espera de acordar deste pesadelo
que me assalta de noite e de dia!

Às perguntas inquisidoras
arranjei respostas perturbadoras...
não quero e não posso
ser o que não sinto
e sinto que quero
amaldiçoar esta sorte que me calhou!

O medo, para mim,
morreu há muito tempo
quando o que era meu
alguém mo tirou!

Deixei o medo
e ganhei a coragem
lutei por mais
e perdi...

Resta-me, para já,
o aqui
o amaldiçoar
e o praguejar
quem ainda tem medo
quem nunca deixou de estar preso...

Ficou-me, para muitos,
esta pouca vergonha,
de recusar
o que nunca me servirá
e de enfrentar
o destino,
sempre que me parecer
pequenino!

Resta-me ainda esperar
que tudo termine
para poder acordar
num outro, qualquer, lugar!

Desta noite dura
sei que me ficará
e que,
nada nem ninguém,
me roubará
esta liberdade minha
que me constrói
por dentro e por fora
que é coração
e muralha
sangue a correr
e pele que me envolve
sentido de cada dia
até ao último
para aí ser também
a minha mortalha!

CFV




sábado, 17 de janeiro de 2015

Submersa


Afogada em mim
dentro do que não sei se sou
e sem saber o que posso ser

Emaranhada dentro
do que não sei quem sou
sem, ao certo, entender
quem, realmente, quero ser

Flutuo numa vida
que chamam minha
mas que desde sempre
duvidei

Talvez por ser cega
de tanta escuridão
e que, de tempos a tempos,
me deixa parada
de pensamentos
congelados

Talvez porque, desde sempre,
a recusei
e de instante a instante
a sinto fugida
distante
ou escondida
mas, decerto,
perdida de mim

Restam-me as mil almas
pois, que de uma
se fizeram
em mil estilhaços
e que, assim, me habitam
em pedaços

Resta-me a espera
que, se agora também ela me aparece destruída,
possa um dia ser desconstruída
e possa, aí, acordar inteira
certa do que sou
e para onde vou
possa aí
acordar dentro da minha própria vida!

CFV






segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Impulso


Agora ficas
a consumir
a fervilhar 
corpo acima
e pensamento abaixo
num eco ensurdecedor
que grita por mais...e mais...

Agora ficas em
olhos que te fecham
num sorriso que te beija...
qual culpado satisfeito!

Vives em cada golo de água fresca
pois que só assim 
não me secam os lábios
que são agora
desejo
entreabertos
e sedentos 
desse calor
que arde 
num crepitar
quente
contínuo 
e lento...

Agora 
mãos...a sós...
numa busca em vão
pelo toque 
intenso e suave 
que se entranha
que as percorre
a todo e a qualquer 
momento...
e fecham-se para, 
quem sabe, 
te guardar, 
bem cá dentro
num momento para sempre!

Agora pairar nesta breve história,
viver aí... 
onde o tempo foi doce instante
onde fomos nós...

Agora é viver-nos na memória...


CFV





quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Etapas




Afinal não ganhei o euromilhões!
Afinal aqui estou eu de volta ao único sítio que não queria voltar!

Sei que, me cabe a mim e só a  mim, procurar alternativas! E sei, no fundo, que só empurrados, a maioria de nós, consegue lançar-se noutra aventura..talvez, no fim disto tudo, perceba que foi por isso que, esta minha etapa, teve lugar na minha vida!

Não me recordo de uma viagem que tenha doído tanto, como a de janeiro deste ano...
Gestos que se repetem, já há muitas despedidas:
os abraços e os beijos enrolados em lágrimas que já nem se tentam disfarçar... já não dá...correm cara abaixo quando se olha para trás...
Olha-se, com vontade de fugir, primeiro de um autocarro que me faz despedir dos lugares de sempre da minha vida.. depois de um avião, com vontade de o perder, que me levará onde sei que morro todos os dias!

E já cá, sem surpresa, sei ao que venho:

uma longa espera...
dias que me alentam apenas pelos meus alunos...
noites que me doem pela saudade que aumenta nesta colina ventosa e silenciosa!

E não é porque não sei viver longe da minha terra e das minhas pessoas, não!
Aliás, voltar para eles e sentir o cheiro dos lugares comuns de uma vida, é a coisa mais fantástica que se pode sentir!
O que custa sem deixar de doer, é esperar aqui, neste lugar sem luz própria, rodeada de vazio e por mais que me esforce, não há maneira de me sentir viva...
Tento, olhando e percorrendo este espaço, com uma paisagem brutal, é certo, mas não me consigo encontrar...perscruto cada canto, olho, sempre de novo, o mar revolto de um azul brilhante, à procura de mim e de finalmente me sentir daqui...mas não!

Não me sinto feliz... É isso!
E eu preciso dessa felicidade que sempre foi minha, muito minha e que me dava a certeza de que iria conseguir onde quer que fosse, era assim que sabia, no mais fundo de mim, mesmo quando tudo parecia desmoronar à minha volta, que iria até ao fim...
É que não sei percorrer caminhos que ficam a meio...e aqui...pela primeira vez desisti... fiquei a meio de um caminho, por cansaço, por nós no estômago, por me sentir inerte, uma morta-viva, que não vive... apenas espera...cada vez mais perdida!
Não sei quem sou...deixei de o saber!
Não sei por onde vou... mas preciso de viver!
Não sei como sair deste longo emaranhado em que se tornaram os meus dias e noites...
interminavelmente sós...

Tempo de mudar...
Chegará a tempo... antes que me perca ...de mim?

CFV




Aperto

Do nada E em tudo Sentes o fim de um tempo E o futuro no presente... O que virá? Quando e como será? Fica ali aquele nó na garganta Um burbu...